quinta-feira, 7 de maio de 2009

O buraco da fechadura



Quem nunca, quando menino não espiou pelo o buraco da fechadura na esperança de ver uma cena que tanto lhe despertava a curiosidade? Ou quem não tem uma vizinha que adora ficar na janela cuidando da vida alheia? E quem não tem aquela vontade louca de saber tudo sobre a vida amorosa e profissional, enfim, a intimidade em geral do seu melhor amigo ou daquela pessoa que você mal conhece ou do astro do mundo televisivo, do cinema ou musical? Isso é chamado de voyeurismo um assunto muito discutido no cinema que por sua vez foi concebido desde suas origens como um lugar (em geral escuro) onde se pode espiar o outro sem ser visto, sendo assim, a própria tela do cinema poderia ser o buraco da fechadura, é tanto que nos primeiros anos do cinema uma quantidade enorme de filmes tratando sobre o assunto voyeurismo foram produzidos. E o primeiro foi, “As seen through a telescope” (1900), e mostra um velho espiando através de um telescópio um casal de namorados, justamente no momento em que o homem acomoda os sapatos nos pés da mulher e o vestido dela se levanta ligeiramente.

Para que a coisa ficasse ainda mais parecida, com o buraco da fechadura, as cenas passaram a ser filmadas com a câmera mais próxima do ator ou do objeto fotografado. Então surgiram clássicos como o suspense “Janela Indiscreta de 1954” do grande diretor Alfred Hitchcock que conta a história de um repórter incapacitado de exercer sua profissão temporariamente, por causa de uma perna quebrada, que sem ter o que fazer passa a espiar através da janela de seu apartamento a vida dos vizinhos. Com o passar do tempo esse voyeurismo cinematográfico foi se aperfeiçoando e em 1998 é lançado um filme chamado “O Show de Truman” que conta a história de uma pessoa que nasceu, cresceu e vive com uma câmera de televisão relatando 24 horas o que acontece na sua vida. No ano seguinte é lançado “EdTV” do diretor Ron Howard e conta a história de um homem comum que firma um acordo com uma emissora de televisão e passa a ter sua vida transmitida ao vivo para todo o país. O filme conta a história da primeira experiência do realismo show (reality show) na televisão. Executivos querendo ganhar muita audiência e é claro, dinheiro, contratam um rapaz simples para ser seguido por câmeras, que, transmitem 24 horas por dia o seu cotidiano e de uma hora para outra as situações mais banais da sua vida, ganham status e grande visibilidade televisiva sua vida então vira um inferno, pois a partir do momento que sua privacidade foi totalmente invadida, o rapaz começa a pagar o preço pelo seu narcisismo, porque nunca havia se preparado psicologicamente para uma total perda de identidade e começa a se sentir tragado pelo protagonista. E isso tudo aliado a sensação de perseguição, ele acaba entrando em um estado de pré-psicose. Certa vez Mchullan disse: “todos querem ter o seu segundo de fama”, mas ele não previu os danos que isso poderia trazer a uma pessoa comum.

No Brasil o reality show deu muito certo e os canais abertos de televisão resolveram investir pesado é tanto que já tivemos: No Limite, Casa dos Artistas e o Big Brother que está na sua nona edição, a principal proposta desse tipo de programa é que os participantes abram mão de sua privacidade e que seus espaços físicos e psicológicos estejam disponíveis de tempo integral ao olhar curioso do telespectador. É tanto que já foi levantada a hipótese, de que o reality show esteja se apropriando das pulsões perversas voyeristas do público que assiste a esses programas.

Segundo o psicanalista e professor da UEM Raimundo de Lima: “Ora, o ser humano precisa tanto de uma certa dose de exposição social como também de privacidade, que é a condição de sua própria sobrevivência psíquica. Sem a privacidade, qualquer sujeito pode ficar louco. Aliás, é um mínimo de privacidade que nos garante a nossa condição de sujeito. O contrário é o eu (ego). Em psicanálise, o sujeito é “o sujeito do desejo” que Freud descobriu no inconsciente. Enquanto que o eu (ego) se situa em um eixo imaginário em oposição a sua própria imagem (o pequeno outro, de Lacan), “o sujeito ex-siste na linguagem”. Ou a fórmula de Freud, pensando um processo de psicanálise: “Onde está o império do instinto animal, o sujeito humano deverá advir”.

Fonte: www.espacoacademico.com.br

Texto: Big Brother: invasão e evasão de privacidade na TV (I)

Do Psicanalista e professor da UEM: Raymundo de Lima

WWW.cineplayers.com

WWW.cinemanu.com

WWW.interfilmes.com

Vídeo: www.youtube.com

Postado por: Luis Leite





4 comentários:

  1. muito legal luis

    Acho 15 minutos de fama totalmente necessários mas 24 horas é demais.

    O que acho mais interesante disso é que o ser humano é tão complexo e depois desses reality shows muitas das pessoas passam a ser só a imagem (cliche) que as pessoas tem dela.

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  2. Luis, neste seu post você tocou em um ponto crucial, que é a neurose. Pois, em EDTV o cara fica desesperado e atordoado com o excesso de assédio. Que cá pra nós, não é agradável pra ninguém.
    Um exemplo claro, determinado jogador de futebol sai com amigos, coisa comum para qualquer mortal, mas pra este individuo qualquer "movimento diferente" que faça é taxado,criticado e vira manchete.
    Nada como ter o nosso momento.

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  3. Acho que o fato de as pessoas se interessarem tanto pela vida alheia também se deve à uma grande infelicidade em suas próprias vidas. Uma fuga. Tipo "Vou ver a vida do outro porque a minha não me faz feliz..."

    É interessante notar como, de fato, é a mídia que permite a existência ou não desses "famosos relâmpago", à medida que, saiu da mídia, ninguém nem reconhece mais aquele ex-BBB que, por meses, estava presente na vida daqueles que acompanhavam o programa diariamente.

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  4. Gostamos de contemplar o que não é nosso. Contemplar o alheio é possuir o que não é nosso mesmo que seja por alguns segundos. Este é o princípio da pulsão pelas imagens..

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