sexta-feira, 15 de maio de 2009

Intertextualidade, cópia, espetacularização e globalização



Não existe história que nunca foi contada, o que existe são formas diferentes de se contar histórias, o autor faz uma colagem, pega referências presentes em outras obras, clichês e faz uma interpretação delas conforme seu repertório cultural e pessoal. Quando esta capacidade termina o que acontece é uma sucessão de histórias non sense e o pior, ocorre um plágio de si mesmo. Para elucidar este pensamento, vou traçar um paralelo entre duas autoras de mesmo nome, adoração por histórias absurdas, mas de destinos diferentes dentro da mesma emissora. A primeira Glória, a Magadan nasceu em Cuba e que fugiu de seu país devido à ascensão de Fidel Castro, foi contratada pela Globo logo em sua inauguração, em 1965 e acumulou as funções de autora e supervisora do núcleo de telenovelas.O estilo de Glória Magadan era rebuscado, recheado de príncipes, sheikes, castelos, desertos, elementos totalmente distantes da realidade brasileira e isso causou a demissão da autora em 1967 após o fiasco da novela “Anastácia, a mulher sem destino” história de Anastácia, uma moça pobre que após descobrir que é filha de Nicolau 3º, último czar russo, refugia-se em uma ilha vulcânica nas Antilhas. A trama tinha um custo alto demais e audiência de menos. Histórias igualmente inverossímeis são características de outra Glória, a Perez, que apresenta o mesmo estilo de sua colega cubana. Glória Perez escreve tramas que muitas vezes desafiam o bom senso e a inteligência dos espectadores, trazendo as exóticas culturas ciganas e do Oriente Médio (esta última parece ser sua obsessão), mas por que ao contrário de Glória Magadan,que foi demitida da Globo,da Tv Tupi, Glória Perez é festejada e considerada a mais criativa autora, sendo que esta faz uma adaptação das absurdas tramas exibidas pelas própria emissora e de histórias clássicas, presentes em todas as novelas e filmes?Uma questão de intertextualidade e espetacularização. A novela O Clone, ambientada no Marrocos, na trama ficava bem próximo ao Rio de Janeiro, as viagens para este país eram feitas em poucas horas. Tudo bem que os aviões estão cada vez mais rápidos e a relação tempo/espaço mudou, leva-se menos tempo fazer uma viagem ao Marrocos do que há vinte, trinta anos, mas não houve mudança na posição dos países, nenhum deles mudou de lugar, muito menos para perto de Rio de Janeiro. Ela trazia muitas cenas da protagonista fazendo passos de dança do ventre, festas típicas, os encontros e desencontros de dois jovens (Jade e Lucas) que por pertencem a culturas opostas enfrentam por anos as diferenças e intervenções da família da moça até conseguirem ficar juntos, o diferencial, o toque de modernidade fica por conta do cientista maluco que resolve brincar de Deus ao clonar o falecido irmão de Lucas. Caminho das Índias, também aposta na exuberância de uma cultura desconhecida por muitos, é repleta de cenas festivas, com danças, moças com seus coloridos sáris e revela uma tradição revestida de preconceito: os dalits que não podem manter qualquer tipo de relacionamento com os demais inidanos, por serem considerados impuros. Neste clima de hostilidade e preconceito nasce o amor de Maya, que pertence a uma família tradicional da casta dos comerciantes e Bahuan, um dalit, adotado por um homem rico, fato este lembra um pouco a lenda de Rômulo e Remo, os gêmeos filhos da mortal Réia Sílvia e do deus grego Ares, ou Marte seu nome latino, que foram jogados no rio Tibre pelo rei Numitor, e sobreviveram porque foram amamentados por uma loba. Bahuan só progrediu, estudou em Harvard, porque foi adotado, o pai adotivo corresponde a loba da lenda. A “pimenta” de “Caminhos” é a rebeldia dos jovens eles questionam as tradições, desafiam os pais e vão a busca de seus sonhos românticos. A personagem Maya, desde o início mostra-se rebelde, ela trabalha em um call center e fala inglês e ao perder a virgindade com Bahuan e engravidar dele. A modernidade pára por aí e em seu lugar entra o sofrimento da protagonista que sem saída casa-se com um homem que não ama. Perceberam que as duas partem do mesmo propósito, o amor impossível, talvez o tema mais utilizado em todas as formas de arte, e no caso desta autora nascem em países de cultura exótica?
Não dá para entender porque Glória Magadan foi demitida, se “Anastácia” naufragou na audiência por não causar nos telespectadores um sentimento de identificação, Glória Perez com suas novelas que exploram as culturas cigana, marroquina e indiana já era para estar fora do mercado há muito tempo se formos pela lógica, porém não existe lógica quando o assunto é televisão, pois ela é feita de ciclos, no início da televisão, as novelas eram demasiadamente espalhafatosas, com o passar do tempo e mudança na mentalidade causada em grande parte pela ditadura e luta por democracia, veio a era das tramas que retratavam a realidade, e a roda gigante girou de novo e estamos uma nova era começou a do real mas não tão real assim, um real açucarado, com a promessa de que no final tudo vai dar certo, para confortar as almas infelizes, cansadas das cobranças da sociedade capitalista,ela impõe que você seja um profissional gabaritado, dê conta do trabalho e viva um amor de conto de fadas, é exatamente por isso que Perez faz sucesso, ela utiliza clichês ficcionais: amores impossíveis, mistério do nascimento, e inova ao promover o choque entre Ocidente/Oriente, mostra países tradicionais que renderem-se ao século 21 e ergueram arranha-céus, abrigam empresas multinacionais. Um outro motivo do êxito dessas novelas é a espetacularização. Destes dois mundos apenas o lado bom é o que aparece, as cenas passadas na Índia são sempre alegres, repletas de músicas, dança, a beleza das protagonistas exploradas ao máximo, o colorido e brilho das jóias e das roupas o shopping center ultra moderno e o hotel de luxo, o caos do trânsito é algo folclórico, que chama a atenção dos visitantes e a pobreza de vez em quando é passada, os personagens deste núcleo são poucos e as falas, idem, o preconceito sofrido pelos dalits é amenizado, os intocáveis parecem conformar-se com sua condição. Já a parte brasileira da trama é dividida em duas, a primeira é rica, elegante e coberta de ouro e a periferia tem como ponto principal um adultério, a mulher veste-se e anda de maneira vulgar e este personagem é visto com graça pelo público. Glória Perez tenta unir e divulgar povos, e retratar o povo brasileiro de forma duvidosa é verdade, isso é a velha mania de tomar o eixo Rio - São Paulo como base para traçar o perfil da população nacional, mas hoje em dia existe uma homogeneidade tão grande, as pessoas querem ser iguais as atrizes das novelas, usam os adereços de seus personagens e por isso que as novelas de Glória Perez façam tanto sucesso.

Postado por Sumaia Santana

Referências bibliográficas:

http://www.telehistoria.com.br/thnews/noticia.asp?id=4325 – acesso em 29/04/09

http://www.museudatv.com.br/biografias/Gloria%20Magadan.htm- acesso em 29/04

http://memoriaglobo.globo.com/Memoriaglobo/0,27723,GYN0-5273-223571,00.html, resenha da novela “Anastácia, uma mulher sem destino” – acesso em 29/04

http://virtualia.blogs.sapo.pt/4533.html, texto: Nos primórdios das novelas - acesso em 10/05

http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/encontramos_romulo_e_remo_.html - acesso em 15/05

http://marfaber.vilabol.uol.com.br/antiga/roma/remoromulo.htm- acesso em 15/05

3 comentários:

  1. Oi Su...
    È minha amiga, e por coincidência tudo teve início exatamente no antigo oriente com Sherazade, uma jovem bela e inteligênte que cria uma estraordinaria história de amor (que durou mil e uma noites), para conquistar o coração do sultão Shariman.

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  2. texto legal

    acho que a diferença drastica de Magadan e Perez seja mesmo o fato que a primeira fazia novelas totalmente fora de nosso contexto nacional e a segunda mescla muito bem as culturas.
    (Tanto que nas novelas acabam se enclementando valores ocidentais como não ser obrigado a casar com alguem escolhido pela familia)

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  3. Assim vou fugir para "América"..hahahah

    O que fico questionando é o quie levou a socieddae brasileira a renegar o folhetim em lugares "exóticos" nos anos 60 e hoje as faz fugir justamente para lá qdo o assunto é novela?
    Isto dá uma tese Sumaia...

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